Figas no Jornal de Notícias

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Aquando da entrevista ao JN nos seus 120 anos.

Poder

Pensamento do Conde:
O poder não reside em quem pensa que manda mas sim em quem desobedece.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

PRESENTE E FUTURO DO ASSOCIATIVISMO POPULAR

PRESENTE E FUTURO DO ASSOCIATIVISMO POPULAR.


O tema, acima mencionado, foi tema dum debate, promovido pela Federação das Coletividades de S. Pedro da Cova. Sobre tal assunto faço a seguinte reflexão:

Desde sempre, os homens se reuniram em grupos para atingirem determinados fins, exemplos da caça, pesca, comércio, indústria, etc.

Nomes como Confraria, Companha, Companhia, Liga, Associação, Corporação, Irmandade, Santa Casa da Misericórdia, são sinónimos, com mais ou menos nuances, nos seus objetivos comuns. O seu estabelecimento e posterior desenvolvimento estiveram, sempre, subordinados ao controlo direto ou indireto do poder político vigente.

Porém, lentamente, às restritas reuniões de pessoas para fins guerreiros ou religiosos, da Idade Média, caso das Ordens Religiosas ou Militares, Hospitalares ou até mesmo Corporações Profissionais, o povo foi exercendo maior pressão sobre as Monarquias, buscando maior liberdade de ação, exigida pela cada vez mais expansão comercial dos reinos ou impérios.

Hoje, reconhece-se que a Revolução Francesa foi o resultado desta pressão e o rebentar de espartilhos vários, que impediam o povo oprimido do usufruto das terras e riquezas acumuladas nas mãos de uma minoria de nobres e religiosos.

Quando não permitidas pelo poder reinante, mesmo assim, os homens continuavam a arranjar formas de reunião e de associação, muitas vezes para discussão de políticas e ações subversivas ao poder instituído.

Deste modo apareceram as Seitas Secretas, de várias tendências, extremamente antagónicas entre si: As fanaticamente religiosas e fundamentalistas e as radicalmente ateístas. Com a progressiva conquista de maiores liberdades cívicas, nomeadamente com a vitória do liberalismo sobre o absolutismo, apareceu o direito à livre reunião e associação de pessoas para fins recreativos, culturais e desportivos. Foi o florescer do Associativismo Popular. Todavia, é de notar que os seus Estatutos tinham de, obrigatoriamente, contemplar a proibição de qualquer atividade política ou religiosa, estas apenas reservadas para associações políticas (Partidos) ou para as Igrejas. Rapidamente, o povo tirou proveito desta possibilidade de reunião de associação, verificando-se um rápido aparecimento número de Associações, de raiz popular para todos os fins, sendo que a maior parte se destinava a fins recreativas, culturais e desportivos. Realce-se que foi nos meios rurais em que o Movimento Associativo teve maior expressão em quantidade, enquanto nos meios urbanos, das grandes cidades, apareciam as de maior expressão eclética e de maior influência sobre o Poder reinante. A crescente oferta, nos meios urbanos, de atividades públicas culturais e desportivas, foi tirando bases de apoio às emergentes associações de bairro e a cada vez maior e forte identificação da população com as que (poucas) acabaram por centralizar e representar grande parte duma cidade ou região. (Parte um, continua)

Em Portugal, atualmente, há catorze mil associações para diversos fins, o que, só a nível de dirigentes, envolve duzentas pessoas. Verifica-se que, hodiernamente, o movimento português procura uma melhor organização e, tudo indica que, brevemente, apareça uma Confederação Nacional de Associações, que se torne parceira social do Governo e que represente e coordene o movimento associativo para uma maior intervenção na Sociedade Portuguesa.

Catorze mil associações, a dividir pelos trezentos e oito municípios do Continente dá uma média de quarenta e cinco por concelho!

Ora, acontece que em Gondomar, à sua parte, tem quase duzentas! Talvez, isto se deva ao facto de Gondomar ser o concelho menos desenvolvido da área do Grande Porto. Um facto que prova esse sub desenvolvimento é que nem todas as Juntas de Freguesia têm edifício de sede própria, exemplo de S. Pedro da Cova, que não tem sede de Junta, mas o Movimento Associativo criou mais de duas dezenas de Coletividades na Freguesia.

O tempo altera os comportamentos sociais do Homem!



Após o final da última grande guerra, a Europa viu-se quase toda destruída. Foi um tempo difícil; de desemprego e de duras provações. Quase tudo faltava. Assim, milhões de pessoas não podiam aspirar a bens culturais e recreativos numa base pessoal, mas sim através dum esforço coletivo. O povo, em famílias numerosas, vivia em casas de espaços exíguos e sem condições de habitabilidade. Nas pequenas aldeias e localidades a Associação Cultural e Recreativa era, além da igreja, (além das feiras e festas) o único ponto de encontro para com outros se conviver e jogar, mais recatadamente do que na barulhenta tasca, uma “suecada” ou partida de dominó, damas ou, então, que maravilha, uma partida de bilhar russo, snooker ou às três tabelas, além de se beber uns copos e ir até aos “fundos”, onde reinava o pano verde…. E mais não digo.

Depois, vieram as novidades da rádio e da televisão! Tudo nisto dá para perceber que as associações davam resposta e supriam de uma maneira coletiva às necessidades individuais dos eus associados.

Em Gondomar, há muitas associações de idade respeitável. O Clube Gondomarense é uma delas. Nele chegou a existir um Salão-Teatro, com 300 lugares e, ainda, duas frisas! Tinha, na altura, talvez a melhor biblioteca do concelho. Foi um dos primeiros locais, em Gondomar, que serviu como cinema! Hoje, com os seus noventa anos, perdeu muito da sua vitalidade, ao recordar que por ele passaram muitas orquestras, tunas e grupos de teatro.

Normalmente, na construção da Sede de cada Associação, e na realização das diversas atividades, apenas entrava o bairrismo dos seus associados, a sua contribuição monetária ou em trabalhos profissionais, mas tudo voluntário! Não havia qualquer apoio das Autarquias. Aliás, Salazar, o Pai do Estado Novo, “apreciava”, muito as Câmaras que mandassem o saldo positivo para lisboa, para fundir em barras de ouro e guardá-las no Banco de Portugal! Ajuda às Associações não havia, pelo contrário mandava a P.I.D.E. “farejar” as suas atividades, não fossem elas de subversão aos ideais do “A Bem da Nação”, como proclamava nos documentos oficiais. Várias Associações sentiram na pele esta apertada vigilância e os seus dirigentes obrigados a “cantar”.

Felizmente que com o 25 de Abril veio maior liberdade e maior desenvolvimento social e cultural, mas, simultaneamente, os cidadãos começaram a ter maior acesso direto, em sua casa, por via de maior desenvolvimento económico, a bens culturais e recreativos, que, anteriormente, só nas associações conseguiam! Exemplo Rádio, T.V. Internet, etc. Hoje, já não é preciso ir às Associações para usufruir as “modernices”! A sedução duma “suecada”, bisca, dominó ou bilhar já não chega! (parte segunda.Continua)

Com a maior motorização da Sociedade, -uma família um carro- para não dizer mais, as famílias pegam no seu carrinho e vão dar uma voltinha! Embora, continuando, o teórico bairrismo, cada membro duma Associação já não tem tempo para a frequentar e dar-lhe vida com a sua presença e convívio!



Por isso é que o Turismo se tornou a maior atividade comercial do Planeta! As pessoas tendem, já não a conviver umas com as outras numa área restrita da sua residência, mas sim buscam contactos e convívios cada vez mais longínquos.

Quase que dá, para concluir que um homem já não convive só com outro, mas sim com o Mundo!

Progressivamente, as atuais Direções das pequenas Coletividades têm extrema dificuldade em arranjar “concorrentes” que os substituam! Os jovens de hoje têm outros interesses: tem uma intensa vida noturna, nas discotecas, frequentam as modernas salas de cinema, passam horas nos Centros Comerciais, alinham nos desportos radicais, vão aos concertos, etc. Ainda se as Associações estivessem abertas até às cinco de manhã, pelo menos nos fins-de-semana…Até que era engraçado! Certamente que os jovens não estão muito interessados em frequentar uma Associação, onde só encontram um punhado de “resistentes” na atividade das cartas, damas, bilhar e alguns copos!...sem ofensa. Há que dinamizar, mas como?

Também se verificou que, lentamente, os associados foram perdendo o seu bairrismo de contribuir e de participar, enquanto, que por influências sociais das cada vez mais melhores políticas sociais dos sucessivos Governos e Autarquias, quase que se tornaram subsídio-dependentes. Ou seja, projeta-se determinada atividade ou evento, calcula-se seu custo, depois apresenta-se o projeto à aprovação do Governo, Câmara ou Junta de Freguesia. Se vem subsídio, muito bem, o projeto vai para a frente, se não vem o subsídio não há a atividade projetada. Claro que aqui, além dum correto apoio ao Associativismo entra um interesse eleitoralista dos políticos, que concedem tais subsídios, mas o facto é que as Associações, conscientemente, ou não, deixam de ser independentes, geradoras atividades autónomas e são mais uns braços ou “filiais” políticas dos Governos ou Autarquias, na execução das suas políticas sociais, culturais ou desportivas!

Os dirigentes associativos, por sua vez sabendo da disponibilidade do Poder político para ajudar, desenvolveram a arte de “sacar” subsídios ao Governo, Câmara ou Junta! enquanto que a participação direta dos Associados vai ficando mais fraca, preocupando-se, estes, mais em receber que contribuir!! Depois, acontece ler-se, na imprensa nacional ou local, que determinada Associação deve a sua subsistência graças aos subsídios que recebe de diversas entidades.

Quer dizer que, se uma vez cortados esses apoios, as atividades, até então desenvolvidas cessam?!!

Já não é com o tradicional pagamento da quota de cinquenta, cem, duzentos ou trezentos escudos mensais, que qualquer Associação pode ter alguma ação digna de nota sem ajuda de terceiros!

Que aconteceria, se Salazar cá viesse e ordenasse que não haveria apoios para ninguém e que cada uma, se quisesse, que desse “à perna”?!! Felizmente que o passado só serve para fazer contraponto com o presente e balizar o futuro. Muitas Sedes, de muitas centenas de Coletividades têm bons espaços e boas instalações. Porém, é pena que milhares delas estejam fechadas das nove às dezanove horas e só abram no horário pós-laboral. Claro que isto é normal, devido às ocupações profissionais dos seus dirigentes e associados, mas, quando se aponta, quanto a mim muito bem, para melhores prestações sociais, culturais, desportivas e recreativas, à Sociedade envolvente da Coletividade, então, há que rentabilizar, ao máximo, as instalações existentes. Aqui, o Poder Político tem de pagar os custos, quase que integralmente, para uma abertura em horários normais, afim que os equipamentos, que, normalmente, estão fechados das nove às dezanove horas, tenham utilidade mais abrangente à comunidade envolvente, seja no apoio escolar, à terceira idade e à ministração dos mais diversos cursos de formação profissional, necessários ao meio. Quanto a mim, no futuro, a tradicional Coletividade e cariz cultural, recreativo ou desportivo, tem, rapidamente, de se tornar IPSS (Instituição Privada de Solidariedade Social) para, deste modo, poder beneficiar dos apoios institucionais do Governo e Autarquias.

Em Gondomar, das quase duzentas Associações só meia dúzia é que são IPSS. Há que também rever o papel de dirigente associativo; sua formação e proteção legal. Repito: o tempo altera o comportamento social do Homem! O que, ontem, era feito numa base voluntária, hoje, tem de ser num base profissional e remunerada! Vejamos que, até nos bombeiros a tendência é para uma maior profissionalização, porque a defesa do Património Nacional não pode estar, eternamente, à mercê de voluntarismos. Não se pode estar à espera que haja, sempre, “comendadores” que ofereçam, com muita festança mais uma ambulância! Não há mais lugar que o regedor, que a troco quase de nada, tinha a maçada de prender o malfeitor. Hoje, isso compete á Polícia profissional e remunerada. Desculpem estes pequenos desvios, mas o intuito é realçar que o Movimento Associativo foi forte desde o início. Criou um rico Património Nacional, teve o seu apogeu, digamos que desde a implantação da República até aos finais da década de oitenta. As Coletividades tradicionais, atualmente estão a atravessar um momento de apatia. Muitas já desapareceram e algumas mais desaparecerão, embora outras novas Associações, por exemplo: de Defesa do Consumidor, dos Direitos Humanos, de Defesa do Ambiente, etc, estejam, a surgir, acompanhando o evoluir da Humanidade. Todavia, já não são do tipo tradicional, mas com fins muito específicos de defender causas ou influenciar políticas. A todas as Associações os Governos e Autarquias têm de dar melhores apoios, para que, sem complexos políticos partidários, sejam bons parceiros sociais no desenvolvimento e aplicação de melhores políticas ao serviço do bem-estar comum e ao fortalecimento da cidadania. Afinal, as Associações existem. Há, ainda, o capital da boa vontade dos seus dirigentes. Se ganharem algum, pouco mais que nada, nunca tal compensará a dedicação a uma boa causa!

Quanto a mim, é preciso avançar nas seguintes direções.

Rapidamente e em força avançar para que muitas mais Associações sejam IPSS. Promover o assalto (no bom sentido) dos jovens no comando das Associações, porque deles é o futuro! Rapidamente, a criação da Confederação Nacional de Associações, para a parceria com o Governo. Que nas Associações se possam debater assuntos de interesse geral ao bem comum.

Os resultados aparecerão, porque, ainda, como disse um destacado dirigente duma Coletividade de S. Pedro da Cova, muitos milhares de contos, disponíveis pelo Governo, para as Associações, não foram utilizados, devido à má informação, o que deriva, obviamente, duma deficiente formação dos dirigentes. Estes, têm de ser, urgentemente, apoiados, senão, sem eles, as Associações fecham. Com elas perdem-se a oportunidade de muitos O.T.LS,s e A.T.L,s, Centros de Dia para a terceira idade, etc.

O tempo altera o comportamento social do Homem. No campo da restruturação das Associações ou Coletividades, há muito a mudar e que adaptar às realidades atuais. Em frente.

Assina. Silvino Taveira Machado Figueiredo

Gondomar

(Nota do autor: Artigo publicado (por partes; três, em 16/Fev/1999, 28/Fev/1999 e 15/Março/1999) no jornal Notícias de Gondomar. Já lá vão 12 anos! Talvez sirva para alguma reflexão da situação atual do Associativismo. Este artigo sofreu alguma correção ortográfica!)



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